O Poder da Nostalgia
- Ana Laura Padredi Bortoloto
- 19 de mar.
- 6 min de leitura
Atualizado: 8 de mai.
Como a indústria do entretenimento faz uso desse sentimento para aumentar o número de lançamentos e fidelizar o público
Por Ana Laura Padredi, Sessão das 4 — Bauru, São Paulo
Todos gostamos de lembrar do passado com carinho e sentir a famosa nostalgia. Ao escutar o novo álbum da Lady Gaga, intitulado como “Mayhem”, me senti teletransportada para 2010, época em que Gaga lançou seus principais sucessos, com um estilo disruptivo e marcante. O lançamento da diva do pop emplacou 12 faixas no Top 200 global.
Muitos fãs da cantora ficaram impressionados com a semelhança da música “Shadow of a man” com o estilo musical do príncipe do pop, Michael Jackson. Vou deixar que vocês tirem suas próprias conclusões;
O sentimento nostálgico também surgiu quando escutei a música “Anxiety” da cantora Doechii, que recentemente ganhou o Grammy de Melhor Álbum de Rap. O sucesso da cantora americana traz a mesma melodia da composição brasileira “Seville”, do violonista Luiz Bonfá. Lançada em 1967, a música foi feita para a trilha sonora do filme “O Estranho Mundo de Zé do Caixão”. Em 2011, o cantor belga-australiano Gotye usou a mesma melodia na música “Somebody that i used to know”. Confira as músicas completas:
Senta que lá vem história
A nostalgia tem nos acompanhado há muito tempo, mas se originou em 1688 na Suiça, quando o médico, Johannes Hofer, identificou uma doença misteriosa que se apresentava como uma saudade patológica de casa que levava a diversos sintomas físicos e mentais. A etimologia da palavra vem do grego nóstos (voltar para casa) e álgos (dor ou sofrimento).

No século 20, houve uma mudança e a nostalgia passou a ser considerada um distúrbio psicológico. Hoje, entendemos como um sentimento de saudade idealizada e irreal de momentos do passado, sendo despertada por lembranças de momentos felizes. Segundo a psicóloga Natália Cordão, a nostalgia possui pontos positivos e negativos.
“Fortalecer o senso de identidade, aumentar o bem-estar emocional e até impulsionar conexões sociais. Ela pode servir como um lembrete de momentos felizes e resgatar valores importantes que fazem parte da história de cada um. O problema ocorre quando a nostalgia se torna um refúgio constante, impedindo o indivíduo de viver plenamente o presente”, destaca a psicóloga.
Efeito pandemia
Como podemos perceber, a existência e os conceitos de nostalgia são antigos, mas durante a pandemia de Covid-19 o consumo desses conteúdos ajudaram a diminuir os efeitos da solidão.
Durante o isolamento social tínhamos muito tempo livre. A saída de muitas pessoas foi reassistir filmes e séries em que o final era conhecido, trazendo assim um sentimento de alívio e controle temporário da realidade incerta daquele momento. Para Natália, o consumo desses conteúdos pode trazer uma sensação de previsibilidade e estabilidade. “Assistir a algo cujo desfecho já sabemos reduz a ansiedade, pois elimina o elemento surpresa e reforça a ilusão de controle sobre algo, mesmo que seja apenas uma narrativa fictícia”, afirma.
Nostalgia como produto
Uma nova onda de nostalgia está vindo com a tendência de marketing chamada Retro-braiding. É uma estratégia que visa relançar marcas, produtos ou elementos visuais antigos, com o objetivo de despertar a nostalgia dos consumidores. Isso pode incluir logotipos antigos, embalagens clássicas, jingles ou até mesmo o relançamento de um produto descontinuado.
Essa estratégia aposta em elementos retrôs, trazendo uma imagem aos consumidores de familiaridade e segurança, por já terem consumido algo parecido, gerando conexões fortes, lealdade e destaque. Fazendo com que ela se diferencie das demais, que utilizam de muitas inovações.
Victória Vasconcelos, professora de inglês de 25 anos, é uma consumidora assídua de conteúdos nostálgicos, porém os produtos não atraem muito sua atenção. “Tenho visto muitos produtos que seguem essa linha na publicidade. Imagino que principalmente na área dos cosméticos, em que tudo parece lembrar as coisas que eu usava quando eu era criança. Elas têm uma estética mais divertida e colorida, como nos anos 2000, mas elas não têm tanto apelo para mim.”
Ainda assim, as marcas perceberam a influência que a nostalgia pode ter na tomada de decisão do consumidor, criando conexões emocionais com o seu público e capitalizando as lembranças do passado. Segundo pesquisa realizada pelo Mission Brasil, divulgada pela CNN, 92,3% das pessoas veem a influência direta de conteúdos digitais na compra de produtos considerados nostálgicos.
Em 2019, a Coca-Cola fez uma campanha de divulgação para a 3° temporada da série Stranger Things, em que relançou a embalagem da New Coke originalmente de 1985. A série em questão se passa no mesmo ano e muitos elementos trazem nostalgia para o telespectador, como produtos da época, roupas, músicas, etc.
Campanha da Série Stranger Things - Imagem: Reprodução Relançamento da New Coke - Imagem: Reprodução
O antigo tá na moda!
Assim como na série Stranger Things, muitos filmes, séries e músicas buscam retratar elementos antigos para gerar nostalgia. Todos os anos são lançadas produções que buscam ter esse efeito nos telespectadores. Um exemplo recente é o filme “Nosferatu”, um remake do longa homônimo de 1922, que conta a história de Conde Orlok e de uma jovem atormentada em seus sonhos por uma criatura maligna. O visual gótico e sombrio traz uma nostalgia da origem dos filmes de terror.
Trecho do remake de 2025 Imagem: Divulgação Conde Orlok no filme de 1922 Imagem: Divulgação
Falando em remake, você sabe a diferença entre reboots, remakes e revivals? Bom, todos são uma estratégia para atrair o público e aumentar as vendas. Agora vamos para as definições.
Remake é uma nova versão de uma obra já existente, podendo mudar alguns elementos, mas nada significativo para a história. Um exemplo é o anteriormente citado “Nosferatu” e vários filmes da Disney que foram adaptados para live-action.

Imagem: Divulgação
Reboot é uma obra que reinicia uma história, desconsiderando versões anteriores e com muitas mudanças, mas resgatando o universo e os personagens. Um exemplo são as variações dos filmes do Homem Aranha.

Andrew Garfield, Tom Holland e Tobey Maguire (da esquerda para direita) Imagem:Divulgação
Revival é quando uma série ou franquia retorna com uma continuação direta, mesmo depois de ter sido considerada finalizada. Bons exemplos de revival são as franquias de Star Wars e Jogos Vorazes que depois de anos lançaram novos filmes.
Poster do filme Star Wars: Episódio IX Imagem: Divulgação Poster no filme dos Jogos Vorazes de 2023 Imagem: Divulgação
Esse tipo de estratégia atrai muitos fãs que sentem falta de seus filmes favoritos. Mas essa tática também pode ser perigosa, por se tornar repetitiva, como no caso dos live-actions, que contam exatamente a mesma história. Para a professora de inglês, Victória Vasconcelos, as produções poderiam ser mais ousadas. “Acho que as obras clássicas se tornaram clássicas por um motivo. É muito bom revisita-las, às vezes até ganhar uma versão mais ousada delas, mas gostaria de ver mais coisas novas sendo apresentadas. Sinto que a indústria cinematográfica tem contado as mesmas histórias de novo e de novo nos últimos anos”, comenta.
Relatos nostálgicos:
Como anteriormente citado, a nostalgia é um sentimento de saudade idealizada de momentos do passado. Confirmando essa definição, a psicóloga Natália associa a memória afetiva causada pela nostalgia a uma sensação de familiaridade. “Quando revisitamos algo do passado, nosso cérebro reconstrói aquelas emoções positivas, na maioria das vezes idealizadas, trazendo sensações de conforto e segurança.”
Guilherme Lelis, de 21 anos, é estudante de publicidade e propaganda em Barbacena, Minas Gerais. Desde de pequeno é apaixonado pelos filmes da franquia de Jurassic Park. Ele conta que reassistir os filmes o faz voltar para a infância. Assim como com outros conteúdos do tipo. Confira a entrevista completa:

Ana Paula Coutinho, de 56 anos, é analista de sistemas e mora em Vitória, Espírito Santo. O filme “Ainda Estou Aqui” fez com que ela se recordasse da casa em que cresceu e as músicas também trouxeram boas memórias. Escute a entrevista completa:

Matheus Augusto Almeida da Silva, de 20 anos, é estudante de arquitetura e urbanismo em Avaré, São Paulo. Ele acompanha divas pop, como Lady Gaga e Katy Perry, desde pequeno. Escute a entrevista completa para saber como ele se sente com o conteúdo nostálgico:

Victória Vasconcelos, de 25 anos, é professora de inglês em Embu Guaçu, São Paulo. Assim como a maioria das crianças dos anos 2000, cresceu acompanhando o canal de desenhos Disney Channel. Até hoje se diverte assistindo “Hannah Montana” e recorda a infância na casa em que cresceu. Escute a entrevista completa:

Rodrigo Gurian Bortoloto, de 50 anos, é engenheiro e mora em Vitória, Espírito Santo. Ao assistir à série “Criminal Minds”, ele se lembra do momento que estava vivendo na época do lançamento do programa. Escute a entrevista completa:

Fabiana Carvalho Morgato, de 20 anos, é estudante de publicidade e propaganda em Bauru, São Paulo. Ela assiste a programas antigos como “iCarly” e o filme “Starstruck: meu namorado é uma superestrela”, para revisitar sentimentos da infância.Escute a entrevista completa:

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