Divas pop como voz e refúgio LGBTQIAPN+
- Mariana d'Abril
- 23 de abr.
- 4 min de leitura
Atualizado: 8 de mai.
Da representatividade à resistência, como essas artistas se tornaram pilares de apoio emocional e político
Por Mariana d'Abril, Sessão das 4 — Bauru, São Paulo
No Brasil, 9,3% da população adulta se declarou LGBTQIAPN+, segundo a Pesquisa do Orgulho divulgada pelo Instituto Datafolha em 2022. No entanto, esse número pode ser ainda maior, uma vez que muitos, devido ao medo da rejeição e à falta de informação, escondem ou demoram a compreender sua sexualidade e/ou identidade de gênero. Essa realidade é agravada pela opressão que continua a marcar o país, criando um ambiente difícil para se expressarem livremente.
Esse contexto infelizmente reflete números alarmantes. Estudos globais mostram que 44% das pessoas LGBTQIAPN+ já consideraram o suicídio, contra 26% de cisgêneros heterossexuais. Os números são ainda mais preocupantes entre os jovens trans: 92% deles pensaram em suicídio.
A Psicóloga de mulheres e membros da comunidade LGBTQIAPN+, Marina Mandarini, conta porque isso ocorre:

Leticia Lofiego é lésbica e relata como o julgamento externo pode afetar o psicológico. “Sempre fui, dentro do possível, muito bem resolvida com o que sentia. Nunca tive grandes conflitos internos em relação à minha identidade ou aos meus sentimentos, mas o julgamento externo sempre pesou. Cresci em um lar religioso e estudei em uma escola cristã, onde existia uma ideia muito clara e muitas vezes limitada do que era certo ou aceitável. Esses olhares e expectativas começaram a interferir na forma como eu me enxergava”, conta.
A jovem diz que passou a se ver como um problema, “um peso”, e que isso afetou diretamente sua saúde mental, pois começou a carregar uma culpa que não lhe pertencia.
Lucas Augusto, conhecido como Guto, conta como foi o processo de entender o que ser gay significava para a sociedade, e como isso poderia refletir em suas relações e na percepção que os outros teriam dele.
“Eu sempre soube que fazia parte da comunidade. Desde criança, já sabia que era diferente, mas só com o tempo fui entendendo melhor o que eu era e como isso tornava minha vida um pouco mais complicada do que a das outras crianças. Atualmente, sinto que tenho mais representatividade, mas o medo do conservadorismo acabar com tudo é constante. O meu maior medo é ter que lidar com um mundo regredindo e ver crianças passando pelo que passei”, declara.
O crescimento do conservadorismo tem sido observado globalmente. Uma pesquisa da agência internacional Glocalities, que analisou mais de 300.000 entrevistas em 20 países, incluindo o Brasil, revelou que homens de 18 a 24 anos se tornaram mais conservadores, superando os de 55 a 70 anos como o grupo mais conservador. Em contrapartida, as mulheres dessa faixa etária têm se tornado mais liberais e antipatriarcais, influenciadas pelas redes sociais e pela desilusão com a política tradicional.
Marina fala sobre os desafios enfrentados por pessoas ao se assumirem e explica como esses obstáculos podem dificultar o processo de autoaceitação:

DIVAS POP E A REPRESENTATIVIDADE
Mais do que ícones musicais, as divas pop se tornaram símbolos de acolhimento, resistência e liberdade para pessoas LGBTQIAPN+. Suas músicas, falas e posicionamentos criam espaços simbólicos de pertencimento. Nomes como Lady Gaga e Chappell Roan se conectam com histórias de quem, por muito tempo, não se via representado corretamente na mídia.
Guto conta que, para ele, foi muito significativo ver Lady Gaga arriscar a própria carreira, construída com tanto esforço, para apoiar abertamente a comunidade. Em 2012, a cantora enfrentou represálias ao defender a causa durante um show em São Petersburgo, na Rússia, onde infringiu leis locais que proibiam a chamada “propaganda de relações sexuais não tradicionais”.

Ele lembra da emoção ao ouvir o hit “Born This Way” pela primeira vez: “Eu chorei muito. Já sabia que ela apoiava pessoas como eu, mas a canção, que fala que Deus não erra, para um jovem gay, filho de pastor, foi muito impactante. Lembro-me de mostrar a música à minha mãe, na inocência dela mudar de opinião a respeito e me amar do jeito que eu sou, mas o impacto da música foi somente em mim”, descreve.
Leticia conta que o impacto gerado pelas divas, não apenas ao levantar a bandeira, mas também ao falar publicamente sobre, é imenso. "Elas criam lugares seguros, espaços de pertencimento. A fala pública, o apoio explícito, o posicionamento. Tudo isso é um convite para que outras pessoas também se permitam existir como são. Ajuda a criar um mundo onde a gente não precisa se esconder, e mais do que isso, ajudam a expandir esse mundo cada vez mais para fora", relata.
A psicóloga fala sobre a importância da sensação de pertencimento que uma representatividade positiva pode gerar:


Leticia conta que elas fazem músicas sobre amor que, no fim, são sobre garotas. “Às vezes orgulhosamente, às vezes só porque é assim. Acho que todo mundo busca essa validação: sentir que os espaços também foram pensados para gente. Que podemos estar ali, viver afetos, sem medo”, afirma. Elas a fazem lembrar da importância de simplesmente viver as coisas, sem tanto peso e sem precisar se explicar o tempo todo.
Músicas que marcaram a Leticia:
Marina conta que o apoio das divas pop pode contribuir para a aceitação, mas que ele infelizmente não é o suficiente para proteger a comunidade:

Guto e Leticia concordam que as divas pop se tornaram refúgios responsáveis por despertar o sentimento de liberdade e pertencimento. O apoio, vindo tanto de dentro quanto de fora da comunidade, mostra que é possível amar e celebrar sem precisar se esconder.
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