top of page

A moda como discurso na CPI das Bets

  • Foto do escritor: Ana Laura Padredi Bortoloto
    Ana Laura Padredi Bortoloto
  • 22 de mai.
  • 4 min de leitura

Para além das aparências, mais 20 milhões de pessoas maiores de 16 anos afirmam ter apostado nas "bets"


Por Ana Laura Padredi, Sessão das 4 — Bauru, São Paulo


Em uma manhã, até então, comum de terça-feira (13), os fãs e seguidores da influenciadora Virgínia Fonseca, acordam sem o tradicional “bom dia” da influenciadora nos stories. O motivo, a mesma foi intimada a comparecer no Senado Federal em Brasília para depor na comissão parlamentar de inquérito (CPI).


Confira trechos retirados do Canal da TV Senado do depoimento da influenciadora:


Reprodução: TV Senado

A CPI das Bets foi instalada em novembro de 2024, e está previsto que vá até dia 14 de junho. A comissão tem alguns objetivos, eles são:  

  • Investigar a influência dos jogos virtuais de apostas online no orçamento das famílias brasileiras;

  • Associação com organizações criminosas envolvidas em práticas de lavagem de dinheiro;

  • Uso de influenciadores digitais na promoção e divulgação dessas atividades. 


Além de Virginia Fonseca, outros 19 influenciadores foram convocados ou convidados a depor. Entre eles, Rico Melquíades prestou depoimento na quarta-feira da semana passada (14) e o influenciador Padre Patrick também já depôs nesta quarta-feira (21).   


Cultura de influência digital tem um papel muito importante para a divulgação e incentivo do consumo dessas casas de apostas. Onde influenciadores assinam contratos milionários, às vezes bilionários, para fazer publicidade dessas plataformas. As pessoas comuns que seguem e acompanham o conteúdo desses famosos, são obviamente influenciadas. O risco está em qual público essas campanhas estão atingindo, onde menores de idade e pessoas com baixo poder aquisitivo estão se endividando por conta dos jogos de apostas. 


Um levantamento feito pelo Instituto DataSenado aponta que 20,3 milhões de pessoas maiores de 16 anos afirmam ter apostado nas chamadas "bets”. A mesma pesquisa revela que 42% dos brasileiros dizem ter gastado alguma quantia em apostas esportivas estando endividados.


Visual para engajar 


A presença da empresária Virgínia Fonseca causou tumulto em Brasília, por conta da quantidade de seguidores nas suas redes sociais e pela escolha da roupa usada para prestar depoimento. 


Com uma maquiagem leve, óculos de grau discreto, cabelos sem finalização de chapinha ou babyliss, Virginia usou um look básico e quase infantil para depor. Visual totalmente diferente do que ela mostra em seu dia a dia nas redes sociais. Internautas comentaram que a escolha dela teve um objetivo muito claro, aparentar inocência e ignorância dos fatos que estavam sendo perguntados. 


A especialista e professora em comunicação social, Jessica de Cassia Rossi comenta sobre o intuito da escolha visual de Virginia. “Essa estética mais infantilizada, com elementos de doçura e suavidade, pode ser uma tentativa de suavizar sua imagem pública em um ambiente predominantemente masculino e de confrontação, como uma CPI. Pode ser uma estratégia de proteção, de aproximação com o público ou de diminuição do impacto do conteúdo sério que ela representa. É como se ela dissesse, visualmente: ‘não sou uma ameaça, sou só uma jovem empreendedora, mãe, influenciadora’. Esse tipo de estratégia visual é comum entre figuras públicas femininas que enfrentam espaços institucionais ainda hostis.”, comentou. 

Foto: Hugo Barreto/ Reprodução: Metrópoles
Foto: Hugo Barreto/ Reprodução: Metrópoles

Mesmo com seu visual “básico”, a influenciadora conseguiu usar da repercussão da CPI para vender sua própria imagem e a da sua empresa, que estava estampada na garrafa de água. Eventualmente, por conta da polêmica e da forma como os políticos presentes agiram com a depoente, o foco foi completamente redirecionado para a as falas e a aparência da depoente. A professora Jessica fala sobre qual deveria ser o real papel da CPI. 


“O problema surge quando a performance midiática ganha mais atenção do que o conteúdo investigado. A CPI tem um papel institucional sério, que é apurar responsabilidades e proteger o interesse público. Se o foco da cobertura ou da opinião pública se desloca para a roupa, o tom de voz ou a maquiagem da depoente, corre-se o risco de esvaziar o debate. O espetáculo da influência não pode se sobrepor ao objetivo político da CPI, que é investigar o funcionamento das casas de apostas e seus impactos na sociedade.”, finaliza. 


Foto: Lula Marques/Reprodução: Agência Brasil
Foto: Lula Marques/Reprodução: Agência Brasil

Essa espetacularização é um reflexo do que disseminado nas redes sociais, onde a venda e as aparências e os números de seguidores valem muito mais do que o conteúdo em si. A doutora em comunicação Vanessa Grazielli Bueno Do Amaral, destaca esse ponto e como isso foi espelhado na CPI. “Nas redes sociais, a busca por engajamento para atender aos formatos propostos pelo algoritmo, cria comportamentos que podem levar à cultura de performance. No caso da CPI das Bets, o evento foi usado como canal de promoção e criação de percepções desejadas pelos participantes.”


No final das contas a comissão se tornou um espetáculo, onde todos queriam vender sua própria imagem. “Os políticos sabem do poder midiático da Virgínia e usam isso a seu favor: aproveitam o alcance dela para projetar suas próprias imagens públicas. É um jogo duplo, em que todos estão tentando capitalizar a atenção.”complementa Jessica. 


O que é e como funciona a Ludopatia? 


O vício em jogos de azar são considerados como uma doença desde de 2015, classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como ludopatia


Essa é uma realidade antiga no Brasil, desde das casas de bingo, de jogos de carta e caça-níqueis. Desde 1993 a “A Irmandade de Jogadores Anônimos" apoia pessoas com dependência em apostas. 


Porém a modernização e a mobilidade desses jogos trouxe uma outra preocupação. Disponível em aplicativos nos celulares, como as bets esportivas e o jogo do Tigrinho, faz com que os jogadores tenham o acesso facilitado às apostas. Estimulando o jogador a ter um comportamento compulsivo, até mesmo escondido de outras pessoas. A pesquisa do Instituto DataSenado revela que homens até 39 anos com ensino médio completo são os maiores usuários de aplicativos de apostas esportivas no país, sendo eles 62%. 


Os sintomas mais comuns de um jogador patológico são quando eles começam a jogar para recuperar o dinheiro que perdeu, quando passam a mentir sobre as apostas. Comportamentos como angústia, pensamento compulsivo sobre o jogo, pedir dinheiro para pagar dívidas, entre outros casos extremos, onde as pessoas podem perder todos os seus bens e a até a própria vida.  




Comments


bottom of page